As etapas aqui apresentadas para a construção científica de um conceito seguem o pensamento histórico-historista de Dilthey[1] :
-esclarecer a origem ou a história da palavra escolhida ou criada;
-determinar a origem ou a história do
conceito escolhido ou criado;
-escolher ou identificar que fatos da
realidade histórico-social-humana serão
traduzíveis do nome ou da expressão geral
escolhida ou criada;
-discriminar os diversos tipos de
formulações ou de experiências,
gerados pelas vivências e concepções de
pessoas e comunidades de pessoas,
traduzíveis do que possa ser a
significação da palavra escolhida ou
criada. Tais vivências e concepções são
denominadas de abreviaturas do fato ;
-separar as abreviaturas distorcivas ou
falsas do fato que, porventura, tenham sido
ou possam ser anexadas ao nome ou
expressão geral escolhida ou criada; tais
abreviaturas são tidas por relações
isoladas ou arbitrárias entre vivências de
fato - realidades de fato - abreviaturas de
fato;
-compor traços distintivos, traços
essenciais e traços suficientes dos fatos,
expressivos do conceito ontocídio. Essa
composição permite a definição do
conceito criado, onde
objeto epistemológico, objeto de trabalho,
fundamentos teóricos, metodológicos,
epistemológicos, históricos, filosóficos,
técnico-instrumentais e campo de ação
estarão delimitados.
Segundo a concepção historista da Escola Histórica Alemã representada por Guillermo Dilthey, a sistemática formadora de um conceito científico parte do pressuposto de que nenhum conceito científico deve ser criado fora da realidade humano-sócio-histórica.
Todo conceito é humano, portanto histórico, corpóreo; procede da vivência e não de “vontade de saber”; conseqüentemente, conceito não é abstração, não é elaboração mental desvinculada da vivência ou experiência vivida.
O corpo de qualquer conceito, incluindo-se o conceito científico, é a vivência: esta é a base do Historismo Alemão; particularmente, é a base do Historismo de Dilthey, da consciência hermenêutica, historista ou científico - experiencial, também nomeada de consciência científico – espiritual:[2]
Na correlação constante das vivências e dos conceitos [até se alcançar a] consciência científico-experiencial [, na qual] não deve haver nenhum conceito que não se tenha formado em toda a plenitude do reviver histórico; não deve haver nada geral que não seja a expressão essencial de uma realidade histórica. [...] Acima de toda representação e estilização do real e do singular, o pensamento esforça-se para chegar ao conhecimento do essencial e necessário; aspira a compreender a conexão estrutural da vida individual e social; porque somente conquistaremos poder sobre a vida social, quando captarmos e aproveitarmos sua regularidade e conexões. As formas lógicas em que se expressam essas regularidades são juízos [ou conceitos gerais] cujos sujeitos são tão gerais como seus predicados.
Entre os múltiplos conceitos gerais do sujeito, ao serviço desta tarefa nas ciências do espírito [ou da vida], encontram-se alguns como filosofia, arte, [ciência], religião, direito, economia.
A definição diltheyana de consciência científico-espiritual ou científico-experiencial, expressa o desenrolar metodológico da crítica da razão histórica, caracterizadora do que pode ser denominado consciência metodológica ou, conforme prefiro, consciência historista, expressa em dois movimentos hermenêuticos básicos:
1o. movimento. correlacionar conceitos e vivências formadas na expressão fundamental e necessária, especial e geral, importante e valorativa do mundo histórico.
O princípio determinante do que é fundamental (um princípio da Estética), necessário (um princípio da Poética), especial (um princípio da Arte), geral (um princípio da Práxis), importante e valorativo (princípio da Ética) deve ser buscado na regras radicais do Historismo e do Empirismo Histórico:
- Primeira regra de Giambattista Vico: verdadeiro é o fato, verdade é o feito, verum ipsum factum;
- Segunda regra de Guillermo Dilthey: o pensamento não pode ir além da vida, ou seja além do mundo histórico, porque esse mesmo pensamento se forma e se desenvolve no mundo histórico porque a razão é histórica.
São dois princípios desconstrutores da suposta supremacia da razão cartesiana, da razão pura kantiana, da verdade da argumentação e da verdade do método na ciência moderna.
As Ciências Experienciais (Humanas e Sociais) não buscam uma suposta verdade, evidenciada pelo argumento nem aquela revelada pelo método e muito menos prova ou evidência disso ou daquilo; para a Escola Diltheyana de Pensamento, a vida, o mundo histórico é sua própria demonstração: buscam o essencial e o necessário do fato histórico ou, simplesmente, do fato, do feito, do realizado, do vivido.
2o. movimento. compreender a conexão estrutural da vida individual e social.
Não é nenhuma genialidade autônoma ou “vontade de saber” de uma pessoa que cria os conceitos gerais de filosofia, arte, [ciência], religião, direito, economia, mas a própria estrutura psicofísica dessa pessoa que é histórica; não são as uniões lógicas artificiosas, criadas por cada um dos sistemas culturais seriados ou especializações com os seus métodos e argumentos, que produzem ou promovem nexos, conexões.
No Pensamento Diltheyano, a pessoa porque é histórica compreende aquela conexão estrutural porque ela própria é essa conexão estrutural: tal compreensão das regularidades e conexões da vida individual e social é a própria fonte do poder sobre a vida social. Este princípio também está no Pensamento Viconiano quando o filósofo napolitano considera que somente compreendemos o que é criação nossa, ou seja, apenas o mundo histórico; o mundo natural é objeto de conhecimento e não objeto de entendimento e de compreensão.
A cientificidade do conceito traduzirá a sistematização da vivência humana conceituada.