A historiografia diz ter sido Manuel de Paiva primo de João Ramalho – o português indianizado e casado com a índia Bartira, filha do líder tupiniquim Tibiriçá: Ramalho (naufragado ou degredado entre 1510 e 1520), Bartira e seus inúmeros filhos mamelucos fundaram o povoamento luso-indígena denominado de Santo André da Borda do Campo – hoje, a própria cidade paulista de Santo André.
1 – TRAÇOS DE PERSONALIDADE
Alguns dos traços de personalidade e de corpo de Manuel de Paiva, abaixo citados, procedem do que o próprio José de Anchieta escreveu sobre ele: robusto e corpulento; hábitos de gente do campo; trabalhava inclusive como padre carpinteiro; espírito altamente religioso e, ao mesmo tempo, fortemente guerreiro (foi capelão militar); afeito às mortificações e às automortificações; obediente às ordens católico-jesuíticas; extremamente cândido; inalterável mansidão e paciência; incansável na caridade; zeloso e diligente no ensino; gozava de boa saúde até os 75 anos de idade.
2. ORDENAÇÃO
Manoel de Paiva foi ordenado presbítero diocesano, em Coimbra, em meados da década de 1530 – 1540.
3. ENTRADA NA COMPANHIA DE JESUS
O presbítero Paiva foi recebido em 1546 pelo padre jesuíta Simão Rodrigues – o fundador da província jesuítica de Portugal, sob as ordens de Inácio de Loyola – e tornando-se jesuíta no ano de 1548.
4. PAROQUIATO
O paroquiato do padre Paiva foi exercido por aproximadamente dez anos na província da Beira, em Portugal.
5. VINDA PARA O BRASIL
O Galeão Velho de Simão da Gama partiu de Portugal rumo ao Brasil, chegando à Bahia em março de 1550 e trazendo quatro sacerdotes para ajudarem o jesuíta Manuel da Nóbrega: Salvador Rodrigues, Francisco Pires, Afonso Brás e Manuel de Paiva.
Juntamente com os quatro padres jesuítas, vieram os primeiros órfãos de Lisboa para o Brasil (talvez sete meninos naquele momento): posteriormente, alguns desses órfãos tornaram-se jesuítas.
6. PRIMEIRAS EXCURSÕES NO BRASIL
O jesuíta Manuel de Paiva fez uma primeira excursão em Porto Seguro e somente após a sua volta ao Recôncavo conheceria pessoalmente Manuel da Nóbrega a quem entregou-se às ordens; fez outra excursão a Ilhéus e voltou à Bahia em 1551, substituindo Nóbrega na direção da Casa dos Meninos (órfãos) de julho de 1551 a janeiro de 1552 quando Nóbrega viajou para Pernambuco.
Ainda em 1552, Paiva foi para a vila luso-indígena do Espírito Santo levando três meninos; após deixar estes meninos no Espírito Santo rumou para o sul do Brasil: São Vicente.
7. MINISTÉRIO
O trabalho jesuítico de Paiva não era diretamente com povos indígenas locorregionais porque não tinha conhecimento de suas línguas: Nóbrega designou-o para uma breve missão em Ilhéus, após a qual foi enviado para a capitania de São Vicente.
Em São Vicente, Manuel de Paiva dedicou-se ao ministério da pregação.
De São Vicente, Paiva e Gregório Serrão participaram de duas expedições luso-indígenas punitivas contra os povos indígenas Tupinambá, cognominados tamoio porque eram os mais antigos moradores da região. Os Tupinambá eram os donos da região que seria invadida, conquistada e rebatizada com o nome de São Sebastião do Rio de Janeiro: a participação do padre Paiva era a de capelão militar.
A primeira expedição punitiva contra os povos indígenas, com a participação de Paiva, foi em abril de 1555 e por terra: a intenção era destruir a caiçara indígena às margens do rio Paraíba, implicando em assassinatos e prisões para tentativa portuguesa de escravização indígena.
A segunda expedição punitiva contra os povos indígenas, com a participação de Paiva, foi por mar: os povos indígenas fronteiriços à região de Iperui. A perseguição e os assassinatos lusitanos receberam a efusão de Paiva: segurando um crucifixo nas mãos, o padre ardia em palavras conclamando os portugueses a não desistirem de arrasar com as populações indígenas locais.
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Os votos definitivos de Manuel de Paiva como coadjuntor espiritual na ordem de Inácio de Loyola foram pronunciados no ano de 1560, em São Vicente, aonde permaneceu nas mãos do novo provincial Luís da Grã até o ano de 1562.
Em setembro do mesmo ano de 1562, Paiva e os Irmãos Manuel de Chaves, Diogo Jacome e Gregório Serrão receberam as ordens sagradas pelas mãos do segundo bispo do Brasil – Pedro Leitão (1519-1573).
8 – PRIMEIRA MISSA NA ALDEIA INDÍGENA DE PIRATININGA
Em agosto de 1553, Manuel da Nóbrega foi pela primeira vez no Planalto de Piratininga e decidiu transferir a Escola de Meninos da Bahia do São Salvador para a região onde se erguia a aldeia indígena de Piratininga e da qual Tibiriçá era o líder Principal: nomeando Manuel de Paiva o superior, partiram mais doze jesuítas de São Vicente para a referida aldeia, nela chegando a 25 de janeiro de 1554.
Os jesuítas da comitiva de transferência da Escola foram, além de Manuel de Paiva: os padres Afonso Braz, Vicente Rodrigues, Francisco Pires e os irmãos José de Anchieta, Gregório Serrão, Manuel de Chaves, Pero Correa, Diogo Jacome. Leonardo do Vale, Mateus Nogueira, Antônio Rodrigues e João de Sousa.
Sob a chefia de Manoel da Nóbrega, os jesuítas chegaram à casa do português indianizado João Ramalho, em Santo André da Borda do Campo, onde pernoitaram.
No dia seguinte, pela madrugada, dirigiram-se para a aldeia indígena de Piratininga, onde chegaram manhã alta: na milenar tradição da hospitalidade, os indígenas locais construíram uma pequena casa para hospedagem dos padres.
O padre Nóbrega designou o padre Manoel de Paiva para celebrante da missa de 25 de janeiro de 1554, no alto do Inhapuambuçu (Piratininga): seu acólito foi o irmão José de Anchieta.
Os participantes da 1ª. missa no local onde se ergueria o Colégio Jesuíta de São Paulo foram o líderes indígenas Tibiriçá e Cauby, João Ramalho e sua esposa indígena Bartira, os demais padres e irmãos da nova comitiva jesuítica: pelo número de pessoas, a missa não pode ser celebrada dentro da casa. Os padres improvisaram um altar ao ar livre para a celebração e nesse local foi erguido o jesuítico e novo Colégio de São Paulo de Piratininga.
Escolhido por Manuel da Nóbrega para ser o superior da missão no planalto de Piratininga, a celebração da missa pelo padre Manuel de Paiva, na presença de indígenas e demais padres, funcionava como um documento oficializando a presença dos jesuítas na aldeia indígena de Piratininga.
Além dos indígenas donos da região, sob a proteção e trabalho deles, os padres fundadores da nova vila lusoindígena (denominada cidade de São Paulo) foram: Manuel de Paiva, superior; José de Anchieta; Gregório Serrão; Afonso Braz; Diogo Jacome; Leonardo Nunes; Gaspar Lourenço; Vicente Rodrigues; Braz Lourenço; Pedro Corrêa; Manuel de Chaves; João Gonçalves, leigo; Antônio Blasques.
As aldeias indígenas Geribatiba e Piratininga e a aldeia lusobrasilíndia Piratininga, apesar de terem despertado o interesse jesuítico para o erguimento de um Colégio, não foram escolhidas: o outro local escolhido para o Colégio ficava na colina entre o Tamanduateí e o Anhangabaú.
Os líderes indígenas Tibiriçá e Caiuby reuniram vários homens indígenas e ergueram uma choupana de 14 passos de comprimento por 10 passos de largura. Esta choupana seria o Colégio para onde foram os jesuítas e os seus primeiros alunos – filhos das etnias indígenas dos Guaianase e Carijó.
O Colégio era escola, dormitório, enfermaria, cozinha e refeitório.
9 – FUNDAÇÃO DE GUARULHOS
Manuel de Paiva e o irmão Gregório Ferrão subiram o Anhembi até o Vale do Paraíba e decidiram fundar dois novos aldeamentos lusoindígenas no setor norte: a aldeia de Guarulhos e aldeia de São Miguel. Tais novos aldeamentos serviram na qualidade de posto militar subsidiando ataques e contra-ataques lusoindígenas aos demais refratários à presença portuguesa em Piratininga.
A fundação de Guarulhos ocorreu a 8 de dezembro de 1560 e por ser esse o dia consagrado a Nossa Senhora da Conceição, o novo núcleo lusoindígena passou a ser conhecido por Nossa Senhora da Conceição dos Guaru: os povos indígenas Guaru pertenciam à microetnia dos Guaianase da família linguística Tupi.
Do local exato da primeira capela erigida em homenagem à Imaculada Conceição não se tem registros: pelo desencontro de datas referentes aos assentamentos luso-indígenas, alguns historiadores atribuem a fundação do aldeamento Nossa Senhora da Conceição dos Guaru a outros religiosos, entre eles o padre João Álvares, João de Almeida e Manuel Viegas.
As pesquisas dos historiadores Adolfo de Vasconcelos Noronha e João Ranali concluiram que a fundação da nova vila luso-indígena de Guarulhos coube ao padre jesuita Manuel de Paiva.
Em torno de uma capela construída pelos indígenas locais, auxiliados na concepção da mesma pelo jesuíta Paiva, surgiu mais um núcleo de povoação lusoindígena no planalto de Piratininga.
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Não é supérfluo reafirmar que as chamadas vilas portuguesas no Brasil eram vilas lusoindígenas, razão porque toda a colonização na América Portuguesa foi colonização lusoindígena: antes e além de ser formada uma cultura afrobrasileira existe, pois, uma cultura lusoindígena.
A cultura afrobrasileira já nasce lusoindígena no Brasil.
10 – PADRE PAIVA NO ESPÍRITO SANTO
O padre Manuel de Paiva, juntamente com Diogo Jacome e Pedro da Costa, foram enviados à capitania do Espírito Santo aonde chegaram em janeiro de 1564: partiram na esquadra de Estácio de Sá que se dirigia à Guanabara (terra indígena) com o objetivo de refunda-la com o nome de São Sebastião do Rio de Janeiro.
Os padres Diogo Jacome e Pedro, porque falavam a língua tupi, foram designados para serem missionários estáveis no Espírito Santo: o primeiro foi para a aldeia lusoindígena de Nossa Senhora da Conceição e o segundo para a aldeia lusoindígena de Nossa Senhora de São João.
Por um período de três anos, o padre Paiva foi o Superior ou Reitor da Casa de Vitória (Escola de Meninos), em companhia do irmão Diogo Fernandes.
11 - FALECIMENTO
Até os seus 75 anos, o padre Paiva estava com boa saúde; entretanto, conforme acontecia no Brasil desde 1536, nova e violenta epidemia portuguesa de varíola alastrou-se no ano de 1584.
Em 1584, o padre Paiva apresentava-se gravemente adoecido, vítima provável da mesma arma portuguesa de conquista de vários povos indígenas – a varíola; enfermo e por sugestão do padre Antônio Gonçalves, foi morar em casa de pessoas amigas, em Vila Velha. Provavelmente esta residência era numa fazenda de Vasco Fernandes Coutinho Filho na qual vivera o padre José de Anchieta no ano de 1597.
Ao estudioso atento e crítico está evidente que, na história dos portugueses no Brasil, quase sempre quando há referência nos livros oficiais de História da fundação de alguma vila portuguesa aparece antes uma violenta epidemia dizimando os povoamentos indígenas daquela mesma região. Os heróis brasileiros assassinando as populações indígenas, igualmente brasileiras, foram as epidemias provocadas, desde as primeiras expedições portuguesas. É a instituição da Guerra Biológica - velha arma de invasão e de conquista conhecida dos grandes infestadores.
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A mudança de Paiva foi no mesmo ano de 1584; seu falecimento deu-se em 21 de dezembro do mesmo ano quando estava com 76 anos de idade e após alguns meses de enfermidade: foi sepultado na então existente igreja de São Santiago, em Vitória – Espírito Santo.
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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ANCHIETA, José de. Textos históricos. São Paulo: Loyola. 1989
QUINTILIANO, Aylton. A Guerra dos Tamoios. Rio de Janeiro: 1968
VASCONCELLOS, Simão de. Vida do padre João de Almeida. Lisboa: Oficina Craesbeekiana. 1658
VASCONCELLOS, Simão de. Chronica da Companhia de Jesu do Estado do Brasil: e do que obrarão seus filhos nesta parte do Novo Mundo, Lisboa, Oficina de Henrique Valente de Oliveira. 1663
VASCONCELLOS, Simão de: Chronica da Companhia de Jesu do Estado do Brasil, 2. ed. Lisboa: A. J.Fernandes Lopes. 1865. 2v.
VASCONCELOS, Simão de. Crônica da Companhia de Jesus. 3. ed. Rio de Janeiro: Vozes. 1977.
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CONTRIBUIÇÕES FUNDAMENTADAS PARA AMPLIAR A BIOGRAFIA DO PADRE MANUEL DE PAIVA SÃO BEMVINDAS: