A palavra sofista deriva das palavras gregas sophós (sábio) e sophia (sabedoria): sophós era o perito, o especialista em seu ofício – qualquer que fosse ele.
Artificial e a-histórica é a suposta “evolução” dos termos sophos e sophia, influenciada pela concepção de mundo de Aristóteles, "para (1) habilidade em uma determinada ocupação, especialmente ofício manual, passando por (2) prudência ou sabedoria em questões gerais, especialmente sabedoria prática e política, para (3) sabedoria científica, teórica ou filosófica." (KERFELD, 1999, p.45)
A partir do século V antes de Jesus, a palavra sophistēs (sofista) aplica-se a vários sábios, a poetas, “a músicos e rapsodos, adivinhos e videntes, aos Sete Sábios e a outros antigos sábios, aos filósofos pré-socráticos, e a personagens tais como Prometeu, sugerindo poderes misteriosos.” (KERFELD, 1999, p.46)
Para relembrar os chamados Sete Sábios para os gregos, inseridos entre o final do século VII e a primeira metade do século VI antes de Jesus, eram Tales de Mileto, Periandro de Corinto, Pítaco de Mitilene, Bias de Priene, Cleóbulo de Lindos, Sólon de Atenas, Quílon de Esparta.
O Movimento Sofista é uma mudança de paradigma (sobretudo pedagógico) ocorrido em Atenas (e nas cidades-estados gregas): o contexto histórico do Movimento Sofista é a efervescência de mudanças sociais, políticas, intelectuais e artísticas, ocorridas em Atenas entre 450 e 400 antes de Jesus, questionando e abandonando crenças e valores adotados e defendidos pelas gerações anteriores.
Pode-se constatar que durante a segunda metade do séc. V antes de Jesus, Atenas foi centro efervescente do Movimento Sofista – embora tal Movimento não tenha se iniciado nem se esgotado neste período.
Os sofistas, vindos da Jônia e da Magna Grécia, foram os criadores do que mais de dois mil anos depois se tornou objeto das Ciências Humanas ou Ciências do Homem e, quiçá, Ciências Sociais ou da Sociedade: ao contrário de muitos filósofos de sua época, os sofistas interessavam-se pelo estudo dos homens e, principalmente, pelos homens em sociedade.
Aos sofistas couberam a introdução em Atenas “o ardor pela dialética e pela retórica, as dúvidas quanto à pretensão da filosofia de conhecer a verdade última das coisas e as discussões sobre a diferença entre o nómos (a convenção, que depende de uma decisão humana) e a phýsis (a natureza, cuja ordem necessária independe da ação humana).” (CHAUÍ, 2002, p.165)
O objeto epistemológico dos sofistas era o homem e o homem em sociedade; a gnoseologia sofística era empírica, ou seja, fundava-se na experiência (empeiria) imediata (e social, vivida historicamente de fato) e, portanto, contrapunham-se à concepção de mundo de Aristóteles cuja gnoseologia fundava-se na dedução; o objetivo da ação sofística era a prática social, ou seja, interessavam-se em preparar os homens para servir à sociedade em que viviam. Nesse sentido, os sofistas são os criadores de um outro tipo de Filosofia – Filosofia Prática ou Filosofia Aplicada e de tal modo oposta à prática filosófica de Platão e de Aristóteles que, justamente, pode ser denominada Sofística para a qual Filosofia não é conhecimento pelo conhecimento, mas conhecimento humano para dar aos homens poder político na e sobre a sociedade em que vivem; portanto, Sofística é Filosofia de desenvolvimento e empoderamento político e social do homem, asseguradora do que hoje se chama (sem ser exercido) poder e controle social.
Sofística é Filosofia Política e Filosofia Social.
Uma das características dos Sofistas como profissionais do ensino era cobrarem honorários para ensinarem sabedoria e virtude. Esta cobrança por instruir outrem na sabedoria e virtude era um rompimento com a tradição grega de considerar inadmissível o ensino de sabedoria e de virtude a qualquer um: a questão é exatamente essa. Os sofistas não faziam acepção de pessoas: eram democratas, socializavam a instrução e não a consideravam privilégio de uma casta de homens. Essa democracia e socialização do ensino, preparando homens para serem políticos eficientes e bem sucedidos, enraiveceu a muitos, inclusive a Sócrates, a Platão e a Aristóteles.
Uma outra característica dos Sofistas era a exposição pública ou epideixis: em geral, numa única apresentação em praças ou prédios públicos e, também, em casas particulares, dispunham-se a falar sobre qualquer tema que lhes fosse proposto; o ensino sofístico igualmente dava-se em classes menores ou seminários e, não raro, havia um contato muito próximo entre professor e alunos.
Três dos métodos da Sofística são a erística (arte da disputa ou da contravérsia através de logoi = argumentos), a dialegesthai (originalmente, a arte da discussão através de pergunta e resposta, ou seja, o método dialético – utilizado por Zenão de Eléia) da qual se originou o método de Sócrates amplamente desenvolvido por Protágoras e a antilógica (oposição de um logos = discurso a outro logos, seja por oposição ou por contradição). Todos estes métodos tem por fundamento a Arte Retórica, ou seja, a arte de persuadir – comum posteriormente a todo discurso (filosófico, científico, religioso...).
Politicamente, os sofistas introduziram na Grécia o princípio da mobilidade social gerada pela educação para todos e, ainda, criaram uma nova Paidéia: quando um estudante iniciava a educação Sofística tinha passado pela escola primária, dividida em três graus. O primeiro, o paidotribês era a educação física e atividades esportivas. O segundo, o citharistês era a música. O terceiro, o grammatistês era a leitura, a escrita e a gramática.
Duas preocupações no ensino dos sofistas são a orthoepeia (dicção correta) e a orthotês onomatôn (correto uso e escrita das palavras e dos nomes): os sofistas e a Sofística inauguram, pois, a arte e a ciência da Linguística.
Caio Prado Júnior resume o método de ordenação do pensamento na Sofística:
-precisão de termos;
-busca de expressões seguras;
-delimitação de conceitos;
-entrosamentos dos conceitos entre si;
-metododização e ordenação do pensamento para “torna-lo nítido, rigoroso, livre de confusões, e adequado ao assunto em debate e considerado.”
A posterioridade incluiram-se, sem muitas vezes mencionar a fonte, os passos da Sofística para ordenação científica do pensamento.
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Na primeira geração de sofistas destacam-se: Protágoras de Abdera e Górgias de Leontini – dois sofistas expoentes do relativismo do saber humano e críticos do eleatismo; Pródicos de Keos; Hípias de Élis, responsável por distinguir do direito positivo as leis não escritas e presentes em povos diversos povos de linguagens diferentes; Sócrates (igualmente fez parte do Movimento Sofista).
Na segunda geração de sofistas destacam-se: Trasímaco de Calcedônia e Crítias, afirmadores da vontade humana e do seu poder; Alcidamos e sua defesa de que a escravidão é relação de poder oposta aos direitos humanos naturais; Polos de Agrigento, discípulo de Górgias; Protarco; Antífon; Cálicles de Atenas, defensor do direito humano natural de poder; os irmãos Eutidemo e Dionisodoro, considerados os fundadores da Erística; Menon; Xeníades de Corinto; Antimero de Mende.
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REFERÊNCIAS
CAMBI, Franco. História da Pedagogia. São Paulo: Unesp. 1999
CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles, volume I. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras. 2002
DILTHEY, Wilhelm. História de la Filosofia. 2. ed. 9. reimpr. México: Fondo de Cultura Económica. 1996
DILTHEY, Wilhelm. Teoria de la concepcion del mundo. 2. ed. em espanhol. México: Fondo de Cultura Económica. 1954
JERFERD, George B. O Movimento Sofista. São Paulo: Loyola. 1999
PRADO JÚNIOR, Caio. Dialética do conhecimento. 6. ed. São Paulo: Brasiliense. 1980; p.161
Carlos Fernandes
Enviado por Carlos Fernandes em 08/02/2013
Alterado em 19/02/2013