4 – INDAGAÇÃO METODOLÓGICA
Com esta sumária exposição, chegamos à pergunta: diante da crítica dos próprios cientistas dos fenômenos naturais sobre o meio de elaboração de seus conhecimentos, realizada posteriormente à concepção de método experimental do século XIX, quais foram os estudos e as pesquisas posteriores a Allan Kardec capazes de absorver tais modificações ou de propor sistematicamente novas metodologias de investigação?
O conceito de Ciência Moderna, a partir da segunda metade do século XX, foi substituído pelo conceito de Ciência Pós-Moderna: entre outros vários pesquisadores das Ciências Positivas, contribuíram para tais mudanças particularmente o físico alemão Albert Einstein, o físico atômico dinamarquês Niel Henrick David Bohr, o físico alemão Werner Karl Heisenberg, o matemático austríaco Kurt Gödel, o físico-químico russo Ilya Prigogine, o físico teórico alemão Herman Haken, o químico alemão Manfred Eigen, o médico e biólogo chileno Humberto Romesin Maturana e seu colega biólogo e filósofo Francisco Varela, o matemático francês René Thom, o teórico Erich Jantsch, o físico norte-americano David Jospeh Bohm, o físico teórico Geoffrey Chew.
Ou seja, a concepção de método experimental da Ciência Moderna (a Ciência Positiva), construída do século XVII ao século XIX, deixou de ser considerada positiva -mais evidentemente a partir da segunda metade do século XX.
Num próximo artigo veremos se realmente Allan kardec se utilizou, no século XIX, dos pressupostos e dogmas das Ciências Positivas ou Experimentais, hoje comprovadamente equivocados ou, no mínimo, limitados e questionáveis.
Talvez Allan kardec tenha se servido apenas da linguagem conhecida de sua época!
5 – O MÉTODO KARDEQUIANO
Kardec explicita o seu percurso metodológico para a elaboração conceitual do Espiritismo, afirmando ter aplicado “a esta ciência o método experimental” por ele seguido desde os seus quinze anos de idade, no Instituto Pestalozzi.[1] Acompanhando a exposição do seu pensamento, na mesma referência, vejamos como descreve o método experimental por ele seguido:
- não aceitação de teorias preconcebidas;
- observação atenta dos fatos de que era pessoalmente testemunho;
- comparação entre os vários fatos apresentados e das várias situações em que os mesmos se produziam;
- dedução de conseqüências a partir dos fatos testemunhados – dos efeitos (fatos produzidos) à reflexão e dedução de suas causas e das conseqüências destas causas para a solução dos problemas obscuros e controvertidos referentes ao passado e ao futuro da humanidade;
- trabalho intelectual de encadeamento dos fatos esparsos testemunhados;
- não aceitação de qualquer explicação sobre a causa dos fatos testemunhados a menos que esta ou aquela explicação pudesse resolver todas as dificuldades conceituais decorrentes daqueles fatos.
Allan Kardec esclarece sobre o seu estado intelectual diante dos fatos observados:
- proceder com circunspecção e não com leviandade, diante dos fatos observados;
- ser positivo e não idealista.
Na condução de suas pesquisas considerava ser circunspecto e ser positivo as duas condições mentais para não se “deixar levar por ilusões”.
Ainda diz sobre as qualidades de um observador atento – qualidades estas que têm desenvolvidas, desde os quinze anos de idade:
- “formar o conjunto, coordenado, colecionando e conferindo, uns com os outros, documentos que tenha recolhido. Procedi com os Espíritos como teria feito com os homens; considerei-os, desde o menor até o maior, como elementos de instrução e não como reveladores predestinados.” Essa explicitação de conduta metodológica de Allan kardec, ele mesmo sendo um observador atento, é absolutamente fundamental para o Espiritismo prático e para se compreender a sua concepção analítica.
Para Allan kardec, análise não é fragmentação de fatos: é formação coordenada do conjunto.
Quando kardec explicita o modo de coordenar os fatos e formar o conjunto diz agir colecionando (compaginando) os fatos: um procedimento analítico oposto aos atos de descartar, excluir fatos e de formar sínteses de alguns fatos selecionados.
O pensamento analítico de Kardec é holístico, sistêmico, complexo, integral: ele antecipa metodologicamente o que se denomina, a partir da segunda metade do século XX, de pensamento holístico, pensamento sistêmico, pensamento complexo. Esse tipo de pensamento opõe-se à concepção filosófica de mundo no naturalismo e suas formulações no materialismo e no positivismo: o pensamento de Allan Kardec é positivo e não naturalista/materialista/positivista.
Antes de explicitar o que é holismo, pensamentos sistêmico e complexo, ainda é notável o fundamento analítico de Kardec diante das comunicações dos Espíritos: são eles “elementos de instrução” e não “reveladores predestinados”. Eis a regra kardequiana para não se iludir com as comunicações dos Espíritos.